O cardeal americano Robert Francis Prevost foi eleito nesta quinta-feira (8) como novo pontífice da Igreja Católica e escolheu ser conhecido como Leão XIV, tornando-se o primeiro a adotar esse nome em quase 150 anos. O último papa a escolher o nome Leão havia sido o italiano Gioacchino Pecci, que assumiu como Leão XIII em 1878.

Leão XIII – Foto: Reprodução/Wikipédia
O nome escolhido por Prevost remete a um dos papas mais influentes da história recente da Igreja: Leão XIII. O último pontífice a adotar esse nome foi o italiano Gioacchino Pecci, em 1878. A escolha do nome Leão XIV remete a uma das figuras mais importantes da história recente da Igreja Católica — um papa que buscou conciliar tradição e modernidade, fé e razão, espiritualidade e responsabilidade social.
Um papa à frente de seu tempo
Leão XIII assumiu o papado em 20 de fevereiro de 1878, em um contexto de intensas transformações políticas, sociais e econômicas na Europa e no mundo. Seu pontificado, que durou mais de 25 anos, é amplamente reconhecido por inaugurar uma nova fase na relação da Igreja com a sociedade moderna.
Uma de suas principais marcas foi a publicação da encíclica Rerum Novarum, em 1891, considerada o marco fundador da Doutrina Social da Igreja. Nela, Leão XIII abordou temas como os direitos dos trabalhadores, a justiça social, o papel do Estado na proteção dos mais vulneráveis e a rejeição tanto do socialismo radical quanto do liberalismo econômico sem limites.
Para o historiador José Miguel Sardica, professor da Universidade Católica Portuguesa, Leão XIII ofereceu à Igreja uma estrutura teórica e institucional para interpretar e responder aos desafios sociais de seu tempo. Ele propôs um caminho alternativo às ideologias dominantes do século XIX, com base na dignidade humana e no bem comum.
Fé e razão: uma aliança possível
Outro ponto central de seu pontificado foi o resgate da filosofia tomista, especialmente por meio da encíclica Aeterni Patris (1879). Leão XIII defendeu que a fé e a razão não são contraditórias, mas podem colaborar na busca pela verdade. Essa postura lançou as bases para um novo diálogo entre a Igreja e as ciências humanas e naturais, em um momento em que muitos viam a religião como oposta ao progresso intelectual.
Educação e formação
Leão XIII também promoveu amplas reformas no sistema educacional católico, incentivando a formação filosófica e teológica baseada em Tomás de Aquino. Reformou os seminários e universidades, buscando preparar intelectualmente tanto o clero quanto os leigos para o engajamento crítico com o mundo moderno.
Diplomacia e presença global
Num momento em que o papado havia perdido os Estados Pontifícios, Leão XIII optou por fortalecer a autoridade espiritual da Santa Sé. Atuou como uma liderança moral internacional, restaurando relações diplomáticas com diversas nações e promovendo o papel da Igreja como mediadora e construtora de pontes entre povos e governos.
O Papa do Rosário
Outro traço marcante de Leão XIII foi sua devoção mariana, especialmente à oração do Rosário. Entre 1883 e 1898, ele publicou doze encíclicas sobre o tema, como Supremi Apostolatus Officio e Laetitiae Sanctae. Leão XIII via o Rosário como um instrumento espiritual poderoso diante das crises do seu tempo — tanto para o fortalecimento da fé quanto para a contemplação dos mistérios centrais da vida de Cristo e de Maria.
NOME LEÃO
O nome Leão remete diretamente a São Leão Magno, o primeiro papa a adotar esse título. Considerado um dos grandes pilares da Igreja, Leão I foi o 45º papa da história e assumiu o trono de Pedro no ano 440, permanecendo no cargo por 21 anos. Faleceu em 10 de novembro de 461 e é lembrado por sua firme liderança espiritual, sua atuação diplomática — incluindo o célebre encontro com Átila, o Huno — e por ser um dos poucos papas reconhecidos como Doutor da Igreja. Seu legado consolidou o nome “Leão” como símbolo de força e doutrina na tradição católica.
🦁 Os Papas Leão: uma linha histórica de fé, liderança e influência
A tradição do nome “Leão” no papado atravessa séculos, sendo assumida por líderes da Igreja em momentos cruciais da história. De Leão I, o Grande, a Leão XII, cada pontífice deixou sua marca com ações que refletem o contexto político, espiritual e social de sua época. A seguir, um resumo do legado de cada um:
Leão I (440–461)
Conhecido como “Leão Magno”, é um dos papas mais reverenciados da história. Durante um tempo de instabilidade no Império Romano, defendeu a doutrina cristã contra heresias e reforçou a autoridade papal. Seu gesto mais emblemático foi convencer Átila, o Huno, a não invadir Roma. Também organizou a estrutura eclesial e fortaleceu a unidade da Igreja. É Doutor da Igreja.
Leão II (682–683)
Seu pontificado foi curto, mas firme no campo doutrinal. Leão II confirmou as decisões do Concílio de Constantinopla III e condenou a heresia monotelita, reafirmando a crença na dupla natureza de Cristo. Teve papel importante na aproximação entre Roma e Constantinopla.
Leão III (795–816)
É lembrado por coroar Carlos Magno como imperador em 800, um momento simbólico que fortaleceu a aliança entre a Igreja e o Império Carolíngio. Trabalhou pela centralização da autoridade papal e enfrentou acusações políticas com apoio do imperador.
Leão IV (847–855)
Dedicou seu pontificado à proteção de Roma. Após ataques muçulmanos, reforçou as muralhas ao redor do Vaticano — chamadas “Muralhas Leoninas”. Também incentivou a reconstrução de igrejas e valorizou a disciplina monástica.
Leão V (903)
Um dos papas menos conhecidos, teve um pontificado curtíssimo, possivelmente de apenas um mês. Foi deposto por Cristóvão, que se autoproclamou papa. Seu caso simboliza o período de instabilidade política da Igreja no século X.
Leão VI (928–929)
Pontífice em tempos conturbados, governou por cerca de sete meses. Seu papado foi marcado pela forte influência das famílias aristocráticas de Roma. Pouco se sabe de suas ações concretas.
Leão VII (936–939)
Buscou restaurar a disciplina eclesiástica e promoveu a reforma monástica. Incentivou a atuação de figuras como Odo de Cluny, sendo um dos primeiros papas a se aproximar do movimento de Cluny, que ganharia força nos séculos seguintes.
Leão VIII (963–965)
Seu pontificado é marcado por controvérsias. Foi imposto pelo imperador Otão I durante um conflito com o papa João XII. Seu reconhecimento como papa legítimo foi debatido, e ele acabou sendo figura central nas tensões entre Roma e o Sacro Império Romano-Germânico.
Leão IX (1049–1054)
Um reformador por excelência, foi um dos principais nomes da reforma da Igreja no século XI. Combateu a simonia e defendeu o celibato clerical. Seu pontificado culminou no Cisma do Oriente, que dividiu a Igreja entre católicos e ortodoxos. É considerado um papa-santo.
Leão X (1513–1521)
Filho dos Médici, representou o auge do mecenato renascentista. Patrocinou as artes e viveu uma corte luxuosa. Contudo, foi sob seu papado que Martinho Lutero iniciou a Reforma Protestante. Leão X excomungou Lutero, sem perceber o impacto duradouro que o movimento teria.
Leão XI (1605)
Governou por apenas 27 dias. Foi eleito com apoio francês, mas faleceu antes de realizar qualquer ação marcante. Seu breve pontificado lhe rendeu o apelido de “Papa Relâmpago”.
Leão XII (1823–1829)
Representa uma postura conservadora após as revoluções que abalaram a Europa. Promoveu rígidas medidas morais e religiosas, retomando práticas tradicionais. Buscou restaurar a influência da Igreja no Estado e combater o liberalismo crescente.
ESCOLHER DE LEÃO XIV
A escolha do nome Leão XIV, portanto, não apenas resgata uma linhagem de líderes firmes e influentes da história da Igreja, como também pode sinalizar o desejo de um pontificado que una tradição e renovação — à semelhança de Leão XIII, cuja visão moldou os rumos da Igreja no mundo contemporâneo.

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